Ramana Maharshi
Que é Ramana Maharshi?
Sri Râmana Maharshi nasceu na região do Tamil Nadu, sul da Índia. Aos 16
anos, após a morte do pai, passou por uma vívida experiência relacionada à
morte e, por seu intermédio, despertou para o estado que transcende, origina,
constitui e engloba os campos físico, emocional e intelectual, passando a viver
permanentemente nesse estado, por alguns denominado realização espiritual.
Depois de algum tempo, abandonou sua casa e família e partiu como sadhu
(peregrino ou eremita) para a cidade de Tiruvannamalai (190 km ao sul de
Madras), onde passou o restante da vida na montanha de Arunachala, considerada
por ele como uma montanha sagrada. A princípio, viveu no grande templo de
Arunachaleswara, permanecendo absorto em meditação, no saguão conhecido como o
de “mil pilares”, de onde teve de se mudar, em razão das pedras que lhe eram
atiradas por um bando de meninos que o viam imóvel no local. Passou então a
viver em um escuro vão no sub-solo do templo, mas os moleques cedo o
descobriram, e continuaram a atirar-lhe pedras. Teve de se mudar muitas vezes e
passou a residir em vários outros santuários e locais adjacentes ao templo,
como jardins, bosques e pomares. Pouco a pouco foi subindo a montanha de
Arunachala, onde viveu em diferentes cavernas e passou a ser conhecido como o
“Maharshi” (grande sábio ou vidente), e “Bhagavan”, o Senhor. Lenta e
gradualmente, discípulos foram se reunindo à sua volta. Vinte e sete anos após
a sua chegada a Tiruvannamalai, um “ashram” ou comunidade espiritual foi
construído ao redor do túmulo de sua mãe, aos pés da Montanha Sagrada de
Arunachala, onde passou a residir até o fim de seus dias. Essa comunidade,
chamada “Ramanashram”, tornou-se um local mundialmente conhecido, para onde se
dirigiam ( e ainda se dirigem, em número crescente) buscadores espirituais de
diversas origens religiosas.
Seus ensinamentos, magistralmente simples, profundos e lúcidos, estão
registrados em grande número de livros. Diversos autores escreveram sobre ele;
entre outros, Arthur
Osborne, em “Ramana Maharshi e o Caminho do Autoconhecimento”, Mouni Sadhu em “Dias de Grande Paz”, Carl Jung, a pedido de Heinrich Zimmer, Somerset Maugham, em “O Fio da Navalha”, William Stoddart, em “O Hinduísmo”, Mateus Soares
de Azevedo em “Ye shall know the truth: Christianity and the
Perennial Philosophy” (EUA, 2005), David Godman, Sadhu Om, H.l Poonja, Maha
Krishna Swami. Em 25 de dezembro de 2007, quando da comemoração do seu
nascimento (data móvel, dependente da posição das estrelas), uma nova biografia
em língua inglesa, com 4.135 páginas distribuídas em oito volumes, contendo 400
fotografias, foi lançada.
Sua presença, que irradiava uma grande paz, tornando fácil e natural a
convivência na comunidade, inclusive com os animais selvagens que habitavam a
montanha, atraiu milhares de pessoas a Arunachala. A essência dos seus
ensinamentos é o “Vichara”(self-enquiry), ou investigação direta, interior, por
meio dos questionamentos: “Quem sou eu?” e “De onde surge o pensamento ‘eu’?”,
para a descoberta da “Verdade, Paz ou Bem-Aventurança, a nossa real natureza”.
“Descoberta” no sentido literal de “retirar o que cobre”, os conceitos. Em
vários momentos, Ramana nos alerta que não se trata de mero questionamento
verbal, mecânico, mas de trazer sempre ao foco da atenção, por meio desse
questionamento, a sensação do “eu sou”, que é a única coisa real, visto que
todas as outras coisas mudam e passam, são transitórias, enquanto esta
consciência do eu permanece. Tal questionamento faz com que a atenção se volte
para o estado natural que ultrapassa o conhecimento, levando à percepção da
inevitável limitação de todos os conceitos, o que faz com que, gradualmente,
definhem e percam sua tirania sobre a mente, deixando de se sobrepor “àquilo
que verdadeiramente é”. Para o ocidente, tal sobreposição é o verdadeiro
conhecimento ["episteme", epi (sobre) + histanai (por, colocar):
sobrepor]. Para a Vedanta, tanto a opinião quanto a “episteme” impedem o
descobrimento “daquilo que é”. A alegoria da caverna, baseada no estudo hindu
da “maya” (literalmente “medir”, “avaliar”), se refere a essa limitação: a
idéia é diferente daquilo que verdadeiramente “é”. É preciso ultrapassar a
limitação dos conceitos, das idéias, das imagens, das representações. Sair da
prisão da ignorância, representada pela caverna, para o espaço infinito da
bem-aventurança. A própria alegoria não é bem compreendida no suposto “mundo ocidental”.
Tomar o resultado da avaliação como verdade é tomar as sombras pela coisa em
si, e, por conseguinte, viver na ilusão. A ignorância basilar é a que existe
com relação ao “eu”. Julgo conhecer-me por meio de uma representação.
Desconhecendo quem é o conhecedor, busco conhecer o universo, os seres vivos,
os objetos.
Deles também construo representações. A representação que construo
a respeito de mim mesmo, que é sempre incompleta, e com a qual me identifico,
busca, em vão, completar-se por meio de conhecimentos, sensações, posses,
prestígio. Nessa busca, ela tem continuidade, com a inseparável sensação de
incompletude e, portanto, de sofrimento.
Quem sou eu? Uma vez que a
representação que crio a respeito de mim mesmo não sou eu – quem sou eu?
Quem está
fazendo essa pergunta? A resposta não pode ser mental, intelectual, pois
constituir-se-ia em uma outra representação. Para a Vedanta pois – sem a
negação da óbvia necessidade, em seu campo próprio, do conhecimento relativo –
o verdadeiro conhecimento implica a não interferência dos conceitos, das
teorias, seja a respeito do mundo e das coisas, seja a respeito de si mesmo, do
estado que ultrapassa o pensamento. Havendo um grande descontentamento em
relação a tudo o que é incompleto, havendo a necessidade e a urgência da
descoberta, o próprio exame e compreensão de todo o quadro, a investigação
sobre o “eu” e a origem do “eu”, levam à não-interferência dos conceitos –
porque se compreende sua limitação, o que provoca o seu definhar – e à quietude
mental. A própria investigação sobre o ‘eu’ e sua origem, ao final, mergulham
na quietude. “Aquieta-te e sabe que Eu Sou Deus”. “Eu Sou esse Eu Sou”. Nesse
estado de silêncio vivo, desperto, o conhecedor, o conhecimento e o objeto do
conhecimento, qualquer que seja ele, são um só. Só há separação no mundo das
representações, das construções mentais, no mundo “daquilo que não é”. Nesse
sentido, conhecer a verdade acerca de si mesmo é conhecer a verdade acerca de
todos os seres e de todas as coisas.
Conhecer a verdade acerca de si mesmo é
ser essa verdade, já que não somos dois, um para conhecer o outro. Cada um é a
própria Verdade absoluta; ou Deus, para usar uma outra palavra.
A expressão “auto-realização”, nos diz Ramana Maharshi, é apenas um
eufemismo para “remoção da ignorância”. Nada há para ser adquirido; há, apenas,
ignorância a ser removida. Somos a própria vida, o Ser Infinito, a fonte de
todas as coisas.
Afirma-se que, no momento em que Sri Ramana faleceu, um magnífico astro,
majestosa e lentamente, cruzou os céus da Índia, sendo visto em grande parte do
país por inúmeras pessoas, que espontaneamente compreenderam o evento que ele
anunciava.
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