
Olharam-se  demoradamente através da sala repleta e barulhenta. 20 anos. Como é  possível que a gente espere 20 anos por alguém? Mas ele esperou. 
Quando  a conheceu ela era pouco mais que uma menina. Amor à primeira vista,  sabe? Amor de juventude, sorvete na tarde de domingo, correr na chuva,  fingindo fugir mas na verdade adorando a aventura. Beijos molhados,  cheios de pretensões e desafios. Namoraram por 5 anos. Mas ele era  também pouco mais que um menino, e meninos querem saborear a vida em  grandes goles, sem moderação e sem paciência...Era tempo de decidir e  ela queria casamento e filhos, o pacote todo. Ele queria apenas ela.  Quando se separaram, chovia. Mas não houve então beijos úmidos na  despedida; apenas olhos marejados e palavras tristes.
Ele  foi-se, saborear a vida e tudo o que achava que encontraria. Ela  conheceu outros sonhos, outros desejos e com um deles construiu a  família que sonhou. Foi, a seu modo, feliz. Ele jamais conseguiu  alcançar o que sempre estivera ao alcance dos dedos e dos olhos.
Encontraram-se  novamente, agora, 20 anos depois. Como é possível que duas pessoas  vivam no mesmo mundo e passem 20 anos sem um encontro?
Ela  sorriu para ele através das pessoas, através dos anos. Ele atravessou a  sala querendo dizer o quanto fora tolo, e que queria os filhos e o  pacote todo. 
-Sinto muito pelo seu marido.
-Obrigada por ter vindo; não sabia que o conhecia.
-Conheço você. Estive fora, e soube assim que cheguei.
-Muito obrigada por ter vindo.
Outras  pessoas queriam falar com a viúva. Ele ficou por perto, pensando. Fora  seu primeiro amor. Quem sabe, com um pouco de sorte, poderia ser o  último. Haveria tempo, mais tarde, quando tudo passasse.
Ele não iria mais a lugar algum mesmo...
 
 


 
