Que é medo?
Temos medo quando não há segurança física; se não
temos garantida nossa próxima refeição, naturalmente sentimos medo. Assim,
fisicamente, no sentido econômico, não haverá medo se a todo ente humano
garantirem alimentos, roupa e morada. Essa é uma necessidade básica do homem,
uma necessidade absoluta. Mas essa segurança física do homem, uma necessidade
absoluta. Mas essa segurança física é negada pelas divisões nacionais e
religiosas, as barreiras nacionais, com seus governos e exércitos, etc. Desse
modo, nega-se justamente o que é absolutamente necessário a todos os homens –
comida, roupa, teto – e isso por causa das ditas divisões nacionais e
religiosas. Não pode deixar de haver medo enquanto existirem essas diferenças
ideológicas, porque elas impedem o que é essencial ao homem. Ao vos
denominardes italiano, inglês, russo ou americano, esta mesma asserção nega
vossa própria segurança. Tende a bondade de prestar atenção, porque, com essa
divisão, ireis criar guerras, produzir mais violência e, por conseguinte, ficar
privados da segurança. Quando virdes isso como um fato real, e não como uma
teoria ou conceito intelectual, então já não pertencereis a nenhuma nação,
nenhuma sociedade, nenhuma cultura; e isso já é uma tremenda revolução.
O medo não é apenas reação das glândulas adrenais,
mas também um processo psicológico. Para compreendermos o medo e dele nos
libertarmos, não intelectualmente, porém de fato, temos de dispensar-lhe uma
penetrante observação, de olhá-lo “bem de perto”. Quando a mente – educada que
foi numa cultura que aceita o temor como parte da vida com toda a sua violência
– compreender o medo, teremos então, talvez, a possibilidade de ficar
completamente livres dele, não só consciente, mas também inconscientemente.
Para examinarmos esta questão do medo, temos de estar vigilantes, isto é, cabe-nos
observar nosso próprio medo, não o medo de que nos falam, ou o medo do
desconhecido, porém o medo que deveras sentimos. O medo não existe sozinho, não
é um fato isolado; ele existe em relação com alguma coisa. De tantas coisas
temos medo: medo do escuro, medo de errar, de não seguirmos a tradição e não
podermos ajustar-nos à sociedade em que vivemos. Tememos a morte, tememos nossa
mulher ou marido, etc. Esse medo nasce da violência. Vede, por favor, como
outro dia dissemos que aqui não estamos fazendo uma conferência; não estais
apenas a escutar um orador, aceitando ou rejeitando o que ele diz, porém, sim,
nós estamos investigando juntos o problema da violência e, portanto o problema
do medo.
Como já dissemos cada problema está relacionado com
todos os problemas dos entes humanos. Se pudermos compreender totalmente um só
problema, veremos, então, que ele está relacionado com todos os outros
problemas e a mente, por conseguinte, estará libertada de todos os problemas
humanos. A liberdade é necessária, liberdade para investigar, olhar, observar;
mas, nós não temos essa liberdade, não somos entes livres. Quanto mais progride
a civilização, tanto mais detestamos a tirania e todas as formas de ditadura.
A ditadura é um retrocesso, mas, e isso é que é estranhável,
não temos objeção à ditadura religiosa. Aceitamos o sacerdote, o dogma, a
tradição, os salvadores, os mestres, etc.; isto é, temos medo, e, por isso,
aceitamos a autoridade. Por conseguinte, compreendendo o medo, coisa muito
complexa, compreenderemos a natureza e a estrutura da autoridade e nos
tornaremos a luz de nós mesmos, não dependentes de ninguém para dizer-nos o que
devemos fazer. Isso é a da maior importância, tendo-se em vista,
principalmente, que o caos, a anarquia e a violência se estão tornando cada vez
maiores no mundo. Quando a mente está confusa, desorientada, sem saber o que
fazer, então, porque sentimos medo, apelamos para alguma espécie de
autoridade... Assim é urgente a necessidade de compreendermos esse complexo
problema do medo, porque a mente que teme é incapaz de pensar com ordem e
precisão. A mente que sente medo está confusa, vive na escuridão. E quase todos
nós temos medo, medo de adoecer, medo da velhice e da morte, medo da opinião
dos outros, etc. É possível, pois, a um ente humano, que tem de viver neste
mundo, ficar radical e totalmente livre do medo – “livre”, não como idéia, como
conceito intelectual, porém na realidade?
KRISHNAMURTI
Vença seus Medos - O que é coragem?
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