Djavan
Esse cantor vem de Maceió,
capital de Alagoas, e nasceu no dia 27 de janeiro de 1949. Filho de uma
mãe afro-brasileira e de um pai ambulante. Sua mãe, lavadeira,
entoava canções de Ângela Maria e Nelson Gonçalves
Djavan poderia ter sido jogador de
futebol. Lá pelos 11, 12 anos, o garoto Djavan Caetano Viana divide seu
tempo e sua paixão entre o jogo de bola nas várzeas de Maceió e o
equipamento de som quadrifônico da casa de Dr. Ismar Gatto, pai de um
amigo de escola.
Da primeira paixão, o futebol,
despontava como meio-campo no time do CSA, onde poderia ter feito até
carreira profissional. Mas é na viagem sonora pela coleção de discos do
Dr. Ismar, que para o pequeno alagoano parecia conter toda a música do
mundo, que desponta um artista: o compositor, cantor, violonista e
arranjador Djavan.
Nascido em família pobre, aprende violão
sozinho, nas deficientes cifras de revistas do jornaleiro. Aos 18, já
anima bailes da cidade com o conjunto Luz, Som, Dimensão (LSD). Não
demora a ter certeza: precisa compor.
Aos 23, chega ao Rio de Janeiro para
tentar a sorte no mercado musical. É crooner de boates famosas – Number
One e 706. Com a ajuda de Edson Mauro, radialista e conterrâneo, conhece
João Mello, produtor da Som Livre, que o leva para a TV Globo. Passa a
cantar trilhas sonoras de novelas, para as quais grava músicas de
compositores consagrados como Dori Caymmi, Toquinho e Vinícius e Paulo e
Marcos Sérgio Valle.
Em três anos, nas horas vagas do
microfone, compõe mais de 60 músicas de variados gêneros. Com uma delas,
“Fato Consumado”, tira segundo lugar no Festival Abertura, realizado
pela TV Globo em 1975 e chega ao estúdio da Som Livre. De lá sai com seu
primeiro disco, das mãos do mítico (de Carmen Miranda a Tom Jobim)
produtor Aloysio de Oliveira. “A voz, o violão, a música de Djavan”, de
1976, é um disco de samba sacudido, sincopado e diferente de tudo que se
fazia na época. Visto hoje, este trabalho não marca apenas a estreia de
Djavan, torna-o figura incontornável na história da música brasileira.
Empolgada com seu novo artista, a
EMI-Odeon investe pesado no segundo disco, “Djavan”. Com uma orquestra
dos melhores músicos da praça de 1978, o álbum, marcado pela descoberta
das grandes canções de amor e desamor, consagra-o como um compositor
completo.
Dois
anos depois, em 1980, Djavan lança “Alumbramento” e mostra que, além de
completo, dialoga bem com seus pares. O disco inaugura parcerias com
Aldir Blanc, Cacaso e Chico Buarque, agora definitivamente colegas de
primeiro time da MPB.
A esta altura, talento reconhecido por
crítica e público, Djavan vê algumas de suas músicas ganharem outras
vozes: Nana Caymmi grava “Dupla traição”, Maria Bethânia, “Álibi,
Roberto Carlos, “A ilha”, Gal Costa, “Açaí” e “Faltando um pedaço” e
Caetano Veloso, retribuindo a homenagem do verbo caetanear, substitui-o
por djavanear em sua versão de “Sina”. Em 81 e 82, Djavan leva o prêmio
de melhor compositor pela Associação Paulista dos Críticos de Arte.
O ciclo vitorioso de lançamentos pela
EMI-Odeon encerra-se em 1981, com “Seduzir”. Um disco de afirmação, como
o próprio Djavan escreveria em seu encarte: “O pouco que aprendi está
aqui. Pleno. Dos pés à cabeça”.
Heranças de “Seduzir” são a primeira
banda própria, Sururu de Capote, composta por Luiz Avellar no piano,
Sizão Machado no baixo, Téo Lima como baterista e Zé Nogueira nos
sopros. Também as tranças no cabelo, imagem que o caracterizaria vida
afora, as primeiras canções a falar da África e o início das turnês pelo
Brasil, guiadas pela produtora Monique Gardenberg e o diretor Paulinho
Albuquerque.
Em
1982, a música “Flor-de-lis”, hit instantâneo do disco inaugural,
torna-se o primeiro sucesso de Djavan no disputado mercado americano, na
voz da diva Carmen McRae, com o título de “Upside Down”. Chega o
convite da gravadora CBS, futura Sony Music, e Djavan embarca para Los
Angeles para gravar, sob a produção de Ronnie Foster, um dos principais
da soul music americana, “Luz” (1982). O trabalho resulta em uma mescla
da musicalidade brasileira típica de se exportar com a influência jazzy
americana.
Em 1984, em Los Angeles, Djavan grava ainda um segundo disco, “Lilás”. Seguem-se dois anos de viagens em turnê pelo mundo.
Em 1986, volta a gravar no Brasil. “Meu
lado”, além do retorno, é também um recomeço. Uma volta ao samba, já com
estilo musical identificado pelo público, mas também um passeio por
baiões, canções e baladas. Este é o Djavan em dez anos de carreira:
explorador do som das palavras, das imagens inusitadas, da variedade
rítmica, das brincadeiras com andamentos, melodias fora dos padrões e
riqueza harmônica. Presente em outras canções, a ancestralidade africana
está impressa em “Meu lado”, com a “Hino da Juventude Negra da África
do Sul” e com ainda maior vigor em “Soweto”, sua primeira canção
efetivamente de protesto, música que abre “Não é azul, mas é mar”
(1987), gravado novamente em Los Angeles. O disco seguinte, “Djavan”
(1989), é lembrado como “aquele de ‘Oceano’ “, o clássico, uma daquelas
raras canções perfeita em forma, conteúdo, música e letra.
Em 1992, na fusão de ritmos e harmonias
inovadoras de “Coisa de Acender”, voltam as parcerias, entre elas, com a
filha Flávia Virginia, no vocal em várias faixas. Aos 45 anos de vida e
20 de carreira, em 1994, Djavan lança “Novena”, obra que marca sua
maturidade. Inteiramente composto, produzido e arranjado por ele, o
disco consolida o trabalho com sua banda, composta então por Paulo
Calazans no teclado, Marcelo Mariano ou Arthur Maia, baixo, Carlos Bala
na bateria e Marcelo Martins, sopros.
Com “Malásia” (1996), a banda se expande
e ganha a participação do naipe de metais: Marçalzinho na percussão,
Walmir Gil no trompete e François Lima no trombone. O álbum traz, raro,
três faixas de outros compositores: “Coração leviano”, de Paulinho da
Viola, “Sorri”, versão de Braguinha para “Smile”, de Chaplin e
“Correnteza”, de Tom Jobim e Luiz Bonfá. No disco, Djavan está reflexivo
e melódico.
“Bicho Solto” (1998), dois anos depois,
já traz o artista festivo e dançante, incendiando pistas ao ritmo do
funk. Ambos os trabalhos comemoram os 20 de carreira, o primeiro com seu
estilo pessoal, o segundo, com o rejuvenescimento do artista. Entre as
parcerias, a entrada definitiva do guitarrista Max Viana, seu filho, na
banda. A marca de dois milhões de cópias vendidas fica a cargo do duplo
“Ao Vivo” (1999). Primeiro gravado fora dos estúdios, o disco traz quase
uma antologia de sua obra, com 24 faixas, 22 grandes sucessos. O
lançamento leva Djavan a três anos de turnê. “Milagreiro”, de 2001, é
uma dupla volta para casa. O primeiro gravado integralmente em seu
estúdio caseiro, com a ajuda dos filhos Max e João Viana e Flávia
Virginia e um retorno à casa original, Alagoas, com a onipresente
temática nordestina.
Em 2004, o músico comemora independência
total, com a criação de sua própria gravadora, a Luanda Records, que
viria a lançar seus dois discos seguintes, “Vaidade” (2004) e “Matizes”
(2007), além de um de suas canções remixadas para dançar, “Na
pista”(2005). É o surgimento do empresário Djavan Caetano Viana. Mas, o
que será que o empresário Djavan quer do artista Djavan? Que este vá do
suingue ao blues, trafegue pelas baladas e por sua personalíssima forma
de fazer samba, mantendo sempre sua característica mão direita ao
violão, inspirado na vida cotidiana para enriquecer suas letras. E que
continue na busca constante por caminhos que renovem sua forma de fazer
música.
Um desses caminhos está explícito no
aguardado album “Ária” (2010), o primeiro que em que Djavan exerce
exclusivamente a arte de interepretar canções de outros compositores.
Sempre rigoroso na condução de sua carreira, ele aguardou o auge da
maturidade vocal para se debruçar sobre um repertório escolhido entre a
sua memoria afetiva e suas antenas sempre ligadas para o que é musical e
interessante. O resultado é a reinvenção de canções clássicas, a
descoberta de tesouros escondidos, música boa sempre. Com os ouvidos e a
empolgação daquele garoto de Maceió que um dia largou a bola pela
música.