Anneliese Michel nasceu em 1952, na
Baviera, recanto alemão em uma família de forte tradição católica. Aos
dezesseis anos, Anneliese passou a ter uma torrente de sintomas,
que de início sugeriam problemas mentais. A Clínica Psiquiátrica de
Würzburg chegou a um diagnóstico: Anneliese padecia de epilepsia associada
à esquizofrenia. Inciou-se então um tratamento intensivo, que durou cerca
de um ano. Acreditando estar recuperada, Anneliese completou o segundo grau e
posteriormente, ingressou na Universidade de Würzburg, para iniciar
o curso de Pedagogia.
Anneliese sonhava em ser professora,
porém seus estudos foram interrompidos. Vozes e visões demoníacas
atormentavam a jovem de forma cada vez mais constante e opressora. As
alucinações começaram enquanto a moça rezava. As vozes, lhe diziam que ela era
uma amaldiçoada. Em 1973, Anneliese estava sofrendo de depressão e considerando
o suicídio. O seu comportamento tornou-se cada vez mais bizarro, ela rasgava
suas roupas, comia carvão e chegou a lamber sua própria urina.
Depois de ser admitida em um hospital
psiquiátrico a saúde de Anneliese não melhorou. Além disso, sua depressão
começou a se aprofundar. Ela começou a ficar cada vez mais frustrada com a
intervenção médica, que não melhorava a sua condição. Em longo termo, o
tratamento médico não foi bem sucedido, seu estado, incluindo a sua
depressão, agravaram-se com o tempo.
Tendo centrado toda a sua vida em torno
da fé católica, Anneliese começou a atribuir sua condição psiquiátrica à
possessão demoníaca. Anneliese tornou-se intolerante à lugares e objetos sagrados,
como crucifixos, que atribuiu à sua própria possessão demoníaca. Ao longo
do curso dos ritos religiosos Anneliese sofreu muito. Foi prescrito para ela
medicamentos antipsicóticos, que ela pode ou não ter parado de tomar.
Em junho de 1970, Michel sofreu uma
terceira convulsão no hospital psiquiátrico, neste momento foi prescrito pela
primeira vez anticonvulsivantes. O nome desta droga não é conhecido e não
trouxe alívio imediato aos sintomas de Michel. Ela continuou falando sobre o
que ela chamou de “faces do diabo”, visto por ela durante vários momentos do
dia. Michel ficou convencida de que a medicina convencional era de nenhuma
ajuda. Acreditando cada vez mais que sua doença era de um tipo distúrbio
espiritual, ela recorreu à Igreja para executar um exorcismo nela. Naquele
mesmo mês, lhe foi prescrita uma outra droga, Aolept (pericyazine), que é uma
fenotiazina com propriedades gerais semelhantes às da clorpromazina:
pericyazine é usado no tratamento de psicoses diversas, incluindo
esquizofrenia e distúrbios de comportamento.
Em novembro de 1973, Michel iniciou o
tratamento com Tegretol (carbamazepina), que é uma droga antiepiléptica .
Michel tomou o medicamento com frequência, até pouco antes de sua morte.
Frustrado o tratamento psiquiátrico, os
pais de Anneliese buscaram o auxílio da Igreja. O padre Ernest Alt acompanhou o
caso. Em 1974, ele chegou à conclusão de que havia indícios veementes de
possessão demoníaca, o que requereria a realização de exorcismo.
Mas somente em setembro do ano seguinte o bispo de Wüzburg autorizou o
ritual, conforme os procedimentos previstos no Rituale Romano.
Por essa época, Anneliese já tinha
assumido um comportamento cada vez mais irascível. Ela insultava, espancava e
mordia os outros membros da família, além de dormir sempre no chão e se
alimentar com moscas e aranhas, chegando a beber da própria urina. Anneliese
podia ser ouvida gritando por horas em sua casa, enquanto quebrava crucifixos,
destruía imagens de Jesus Cristo e lançava rosários para longe de si. Ela também
cometia atos de auto-mutilação, tirava suas roupas e urinava pela casa com
frequência.
Anneliese foi submetida há 67 sessões
de exorcismo que se seguiram, numa freqüência de uma ou duas por semana, e se
prolongaram inicialmente por cerca de nove meses, durante os quais ela muitas
vezes tinha que ser segurada por até três homens ou, em algumas ocasiões,
acorrentada. Ela também lesionou seriamente os joelhos em virtude das
genuflexões compulsivas que realizava durante o exorcismo, aproximadamente quatrocentas
em cada sessão.
Nas sessões, que foram documentadas em
quarenta fitas de áudio para preservar os detalhes, Anneliese manifestou estar
possuída por, pelo menos, seis demônios diferentes, que se autodenominavam
Lúcifer, Caim, Judas, Nero, Hitler e Fleischmann, um padre caído em desgraça no
século XVI.
Todavia, o Rituale Romanum, assim como
o tratamento com psicotrópicos, também não surtiu o efeito desejado.
Após um sonho com a virgem Maria,
Anneliese predisse a data de sua morte: 1 de julho de 1976. E exatamente
em 1 de julho de 1976, no dia em que Anneliese teria predito sua liberação, ela
morreu enquanto dormia. À meia-noite, segundo o que afirmou, os demônios
finalmente a deixaram e ela parou de ter convulsões. Anneliese foi dormir
exausta, mas em paz, e nunca mais acordou, falecendo aos 23 anos de
idade. A autópsia considerou o seu estado avançado de desnutrição e
desidratação como a causa de sua morte por falência múltipla dos órgãos. Nesse
dia, o seu corpo pesava pouco mais de trinta quilos.
Logo após o falecimento de Anneliese,
os padres Ernest Alt e Arnold Renz fizeram o comunicado do óbito às autoridades
locais que, imediatamente, abriram inquérito e procederam às investigações
preliminares.
Os promotores
públicos responsabilizaram os dois padres e os pais de Anneliese de homicídio
causado por negligência médica. O bispo Josef Stangl, embora tivesse dado a
autorização para o exorcismo, não foi indiciado pela promotoria em virtude de
sua idade avançada e seu estado de saúde debilitado, vindo a falecer em 1979.
Josef Stangl foi quem consagrou bispo o padre Joseph Ratzinger, que no futuro
se tornaria o Papa Bento XVI.
No julgamento, os médicos psiquiatras,
que prestaram depoimento, afirmaram que os padres tinham incorrido
inadvertidamente em “indução doutrinária” em razão dos ritos, o que havia
reforçado o estado psicótico da jovem, e que, se ela tivesse sido encaminhada
ao hospital e forçada a se alimentar, o seu falecimento não teria ocorrido.
A defesa judicial dos padres foi feita
por advogados contratados pela Igreja. A defesa dos pais de Anneliese
argumentou que o exorcismo tinha sido ato lícito e que a Constituição Alemã
protege os seus cidadãos no exercício irrestrito de suas crenças religiosas.
A defesa também recorreu ao conteúdo
das fitas gravadas durante as sessões de exorcismo, que foram apresentadas ao
tribunal de justiça, onde, por diversas vezes, as vozes e os diálogos — muitas
vezes perturbadores — dos supostos demônios eram perfeitamente audíveis. Em uma
das fitas é possível discernir vozes masculinas de dois supostos demônios
discutindo entre si qual deles teria de deixar primeiro o corpo de Anneliese. Ambos
os padres demonstraram profunda convicção de que ela estava verdadeiramente
possessa e que teria sido finalmente libertada pelo exorcismo, um pouco
antes da sua morte. Ao fim do processo, os pais de Anneliese e os dois
padres foram considerados culpados de negligência médica e foi determinada uma
sentença de seis meses com liberdade condicional sob fiança.
.
Este é o áudio real do exorcismo que
foi utilizado durante o julgamento. É perturbador!
Anneliese Michel (Leiblfing, 21 de
setembro de 1952 — Klingenberg am Main, 1 de
julho de 1976) foi uma jovem alemã de
família católica que acreditava ter sido possuída por
uma legião de demônios, tendo sido submetida a uma intensa série
de sessões de exorcismo pelos padres Ernest
Alt e Arnold Renz em 1975 e 1976. O Caso
Klingenberg, como passou a ser conhecido pelo grande público,
deu origem a vários estudos e pesquisas, tanto de
natureza teológica quanto científica, e serviu como inspiração
para os filmes O Exorcismo de Emily Rose, dirigido pelo
cineasta estadunidense Scott Derrickson, e Requiem,
dirigido pelo polêmico cineasta alemão Hans-Christian Schmid.
Anneliese experimentou o que
é reconhecido por profissionais médicos como graves distúrbios psiquiátricos a
partir dos 16 anos de idade até sua morte, aos 23 anos,
de desnutrição secundária à doença mental. Depois de vários anos
de tratamento psiquiátrico ineficaz, ela se recusou ao tratamento médico e
solicitou um exorcismo. As graves conseqüências atribuídas ao ritual de
exorcismo sobre a jovem motivaram a abertura de um processo criminal pelos
promotores de justiça locais contra os pais de Anneliese e os padres exorcistas,
causando uma grande polêmica em toda a Europa e dividindo
a opinião pública mundial. Ambos os padres que realizaram o exorcismo
e os pais de Michel foram condenados por homicídio negligente porque
não procuraram tratamento médico.