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14 de dez. de 2011

ANTROPOCENO: Bem-vindo à Era do homem



Cientista diz que humanos alteraram tanto o planeta que deram início a uma nova época geológica.
Novo mundo: para Zalasiewicz, o homem acelerou mudanças na Terra.

A Terra existe há 4,6 bilhões de anos; os humanos, há 195 mil. Em menos de 0,01% da história terrestre, já alteramos tanto sua química e biologia que especialistas dizem que detonamos uma nova era: o Antropoceno – em grego, algo como “novidade humana”. O período teria começado há 200 anos, com a Revolução Industrial, e dado fim ao Holoceno (“totalmente novo”), ainda vigente na ciência tradicional. A Comissão Internacional de Estratigrafia, que determina a divisão do tempo geológico, formou um grupo para decidir se estamos mesmo no Antropoceno. Seu diretor, o geólogo inglês Jan Zalasiewicz, diz que ainda é cedo para dizer se o termo será formalmente aceito, mas que não há dúvida: vivemos em um planeta moldado pela ação do homem.


Como medimos o tempo geológico?

Jan Zalasiewicz: Dividimos o tempo em unidades que duram milhões de anos, baseadas em mudanças significativas na história da Terra, como alterações na química planetária e nos animais e plantas. Um exemplo é a mudança da Era Mesozoica, a dos dinossauros, para a Cenozoica, dos mamíferos. Essa passagem foi abrupta, provavelmente guiada pelo impacto de um meteoro. 
Estamos no Período Quaternário, que tem 2,5 milhões de anos e se caracteriza pelo planeta entrando e saindo de eras do gelo. Dentro desse período, vivemos no Holoceno, que começou com o fim da última glaciação e já dura 11 mil anos – isso, claro, enquanto o Antropoceno não é aceito formalmente.

Por que estaríamos em uma nova era?

Zalasiewicz: Essa ideia não é tão nova. Alguns geólogos do século 18 já sugeriam que os humanos estavam causando um impacto tão grande na superfície do planeta que poderíamos estar vivendo uma nova fase. Por muito tempo, eles não foram levados a sério. Outros cientistas diziam que nossas interferências poderiam parecer grandes, mas não eram tão grandes quanto o impacto de um vulcão ou terremoto. Isso mudou há 11 anos, quando Paul Crutzen, ganhador do prêmio Nobel de Química, sugeriu o termo Antropoceno. A partir daí, cientistas começaram a usar a palavra em seus estudos, mesmo que de modo informal.

Como conseguimos mudar tanto o planeta em tão pouco tempo?

Zalasiewicz: Os humanos têm sido muito efetivos em fazer mudanças na superfície do planeta. Para alimentar 7 bilhões tivemos que converter uma porção muito grande da superfície em terra de agricultura, com plantações. Também cobrimos grande parte do planeta com nossas cidades. Para construí-las, pegamos calcário e areia e convertemos em outros tipos de rocha, como concreto, tijolos e vidro. Também fizemos grandes mudanças na biologia: além de causarmos muitas extinções, transportamos animais por todo o planeta, criando o fenômeno das espécies invasoras. É difícil achar outro ser vivo que, sozinho, tenha mudado tanto o planeta. Só há paralelo no Período Cambriano, quando uma nova bactéria começou a transformar dióxido de carbono em oxigênio, mudando toda a atmosfera.

Nós mudamos nossa atmosfera também?


Zalasiewicz: Sim. Aumentamos a quantidade de dióxido de carbono na atmosfera em 40% e elevamos a quantidade de outros gases de efeito estufa, como óxido nitroso. Ao criarmos fertilizantes, duplicamos a quantidade de nitrogênio reativo na água e na superfície da Terra. São mudanças químicas bem substanciais. Também alteramos a refletividade do planeta, nossa capacidade de absorver e refletir a radioatividade do sol. Em resposta a essas mudanças, parecemos estar esquentando a superfície da Terra.
 Por enquanto, esse aumento é modesto, mas as previsões dizem que pelo final do século as temperaturas terão subido entre 2 °C e 5 °C. O nível do mar vai aumentar, e também deverá mudar a distribuição de animais e plantas em todo o planeta, que, se não conseguirem se adaptar ou migrar, serão extintos.

E quais as mudanças na superfície?

Zalasiewicz: Estamos alterando a face da Terra por meio do modo como transportamos pedras e sedimentos. Para construir nossas cidades retiramos milhões de toneladas de materiais da natureza. 
Afetamos a sedimentação e a erosão naturais com a agricultura. Temos represas construídas em muitos dos rios, o que segura grandes quantidades de sedimentos que teriam atingido o mar. Os geólogos do futuro vão encontrar sedimentos muito diferentes ao analisar nossas áreas costeiras. Elas serão camadas geológicas com concreto, metal e plástico, completamente diferentes de qualquer outro tipo já registrada. Quando o nível do mar subir, podemos até afetar as erupções vulcânicas. No passado, elas eram mais frequentes em tempos onde o nível do mar se alterou. O aumento do nível joga água dentro de crateras e produz pequenas explosões.

Qual é o papel do Grupo de Trabalho do Antropoceno, do qual você faz parte? 

Zalasiewicz: Queremos ouvir os cientistas favoráveis e contrários à ideia antes de formalizar o termo. Vamos analisar o Antropoceno, e esperamos chegar a uma proposta. Temos de levar vários aspectos em conta: se vale a pena usarmos o termo, se ele será uma época, período ou era , e seu início. Além do ano 1800, que marca a Revolução Industrial, alguns geólogos sugerem que comecemos a marcá-lo a partir da era nuclear. Depois de 1945, todos os sedimentos estão contaminados com resíduos nucleares, provenientes de testes com bombas atômicas. Nosso estudo será analisado pela Comissão Internacional de Estratigrafia. Estimo que isso demore uns 5 anos.


Isso pode afetar nossa visão de mundo?

Zalasiewicz: O Antropoceno se diferencia de outros intervalos geológicos porque o estamos causando — e ele pode ser altamente danoso ao planeta e à biodiversidade. Gente de fora da geologia começou a se interessar pelo assunto porque ele nos dá uma ideia de como lidar com isso e proteger o planeta.