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2 de jul. de 2011

Paleta pré-histórica

Paleta pré-histórica

Mapeamento de metais por raios X em fósseis abre caminho para revelar as cores de animais já extintos há milhões de anos. Conhecer a coloração de penas, pelos e peles pode ajudar a compreender melhor a evolução da vida na Terra.


Ilustração da ave ‘Confuciusornis sanctus’ em vida feita a partir do padrão de cores revelado pelo mapeamento de metais presentes em seu fóssil. (imagem: Universidade de Manchester; Black Hills Institute e SLAC National Accelerator Laboratory)
Uma das grandes curiosidades de paleontólogos e amantes da pré-história é saber a cor real de dinossauros e outros animais dos quais hoje restam apenas fósseis. Um estudo publicado nesta semana na Science Express chega mais perto dessa resposta ao apresentar um método capaz de revelar os pigmentos originais de penas e tecidos corporais milenares.


Pesquisadores dos Estados Unidos, Inglaterra e China submeteram um fóssil completo da ave pré-histórica Confuciusornis sanctus, que viveu há 120 milhões de anos, a um tipo especial de aparelho de raios X, por radiação síncrotron, que mapeia os diferentes elementos químicos de um material.
O intuito do experimento era buscar resquícios de melanina, grupo de pigmentos que dão cor a pele, pelos, penas e olhos de todos os animais. Apesar de o fóssil estar bem conservado, esses pigmentos não foram encontrados.


No entanto, o mapeamento revelou uma grande quantidade de cobre espalhado nas regiões do fóssil correspondentes às penas. O cobre é um dos elementos presentes na eumelanina, pigmento responsável pelos tons de preto e marrom.
Pela forma peculiar do cobre descoberto – específica de pigmentos de melanina – e por sua distribuição muito semelhante à encontrada em aves atuais, os pesquisadores acreditam que o metal seja um indício de que, em vida, as penas do animal continham o pigmento eumelanina e, portanto, eram escuras.
“Tudo indica que o Confuciusornis sanctus era um pássaro escuro, com suas penas mais longas próximas do preto”, diz um dos autores da pesquisa, o paleontólogo Philip Manning, da Universidade de Manchester, na Inglaterra.


Surpresas da tecnologia

C. sanctus síncrotron
Distribuição dos elementos químicos, captada por raios X síncrotron, no fóssil de ‘Confuciusornis sanctus’. O azul corresponde ao cálcio dos ossos e o vermelho, ao cobre, que está associado ao pigmento eumelanina, responsável pelas cores preta e marrom das penas. (imagem: Universidade de Manchester; SLAC National Accelerator; Universidade de Harvard)
Os resultados obtidos com o C. sanctus foram uma grande surpresa para o grupo. “As informações que conseguimos estão muito além de tudo o que podíamos sonhar”, conta Manning. “O potencial que essa técnica tem de suavemente desvendar a química de espécies extintas é de tirar o fôlego.”
Antes da pesquisa, o estudo que havia chegado mais próximo de revelar a cor dos fósseis em vida tinha encontrado melanossomas (organelas que fabricam e armazenam os pigmentos de melanina) já vazias em um 



Segundo Manning, a técnica desenvolvida por seu grupo vai além, pois os raios X da radiação síncrotron revelam os resquícios dos pigmentos mesmo quando essas espécies de ‘saquinhos de tinta’ não existem mais. 
O geólogo brasileiro Ismar de Sousa Carvalho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), vê na pesquisa um exemplo do uso bem feito das novas tecnologias no estudo da pré-história.
“Esse estudo mostra como a paleontologia está sendo reinventada com a inserção de novas metodologias e técnicas usadas de forma criativa e integrada no processo de reconstrução da vida”, comenta. “Um verdadeiro efeito Lázaro, ressuscitando o inerte e dando-lhe uma nova chance de viver o presente.”


De dodôs a dinossauros

Além do cobre, outros metais, como zinco e ferro, estão relacionados aos pigmentos dos animais. Mas, até o momento, os pesquisadores só puderam identificar com precisão a eumelanina, o que lhes dá apenas uma ideia monocromática de como era a fauna pré-histórica em vida.
“Mais estudos são necessários antes que possamos decifrar outros pigmentos, mas o nosso sucesso com a eumelanina nos dá uma esperança bem razoável de que mais detalhes de cores podem ser descobertos com o nosso método”, afirma outro autor do estudo, o geólogo Roy Wogelius, também da Universidade de Manchester.
Os pesquisadores explicam que conhecer a cor de animais extintos é uma forma de entender processos de seleção natural que influenciaram sua evolução. Aspectos como a camuflagem e a seleção do parceiro sexual muitas vezes dependem da cor.
"A química dos pigmentos guarda a chave para descobrir a completa paleta de cores do passado"
“A cor tem tido um papel importante nos processos de evolução que direcionaram o rumo da vida na Terra por centenas de milhares de anos”, afirma Manning. “Revelar padrões de cores em animais extintos pode desfazer mistérios sobre períodos cruciais da evolução de uma espécie.”
Manning e Wogelius avisam que já iniciaram uma nova pesquisa em busca da cor da pele de dinossauros.
“Estamos apenas começando a decifrar a complexa narrativa da química da vida e da morte”, afirma Manning. “Nossos resultados indicam que a química dos pigmentos guarda a chave para descobrir a completa paleta de cores do passado, dos dodôs aos dinossauros.”




Por: Sofia Moutinho
Publicado em 30/06/2011 | Atualizado em 30/06/2011